Por Jorge Folena

No Brasil, os proventos recebidos por aposentados e pensionistas são considerados como “aquisição de disponibilidade econômica ou jurídica” para fins do fato gerador do pagamento do imposto de renda (artigo 43, II, do Código Tributário Nacional).

A Constituição diz que a União pode instituir imposto sobre “renda e proventos de qualquer natureza” (artigo 153, I). Contudo, a mesma Constituição, em seu artigo 145, § 1º, prevê que “sempre que possível, os impostos terão caráter pessoal e serão graduados segundo a capacidade econômica do contribuinte”.

Com efeito,  um debate justo é necessário para definir se  os salários e os proventos, recebidos por trabalhadores ativos e inativos, deveriam ser considerados como “renda” para fins de tributação. Isto porque, em geral, não constituem nenhum acréscimo patrimonial efetivo, mas representam tão somente a remuneração pela prestação da força de trabalho, que, na grande maioria das vezes e principalmente nos dias atuais, não é suficiente para cobrir as necessidades fundamentais dos trabalhadores e de suas famílias durante todo o mês.

Por outro lado, desde 1996 o país optou por não cobrar imposto de renda sobre a distribuição de lucro (Lei 9.249/95, artigo 10), o que favorece aos banqueiros, cujos bancos anualmente batem recorde de aumento em sua lucratividade. Neste ponto, não se questiona aqui a isenção para os  micros, pequenos e médios empresários optantes do simples (Lei Complementar 123/2006, artigo 14), que lutam para sobreviver, numa sociedade cada vez mais informal nas relações de trabalho, que empurra as pessoas para o regime de “pejotização” para que tenham acesso a renda e serviços para sobreviverem.

Mas não são estes os pontos que se pretende ora questionar, mas sim o anúncio de que a Corte Suprema da Nação Argentina declarou a inconstitucionalidade da cobrança do imposto de renda sobre os proventos pagos aos aposentados, o que fez no julgamento dos processos FPA 2138/2017/CS1-CA1 e FPA 2138/2017/2/RH1 (Godoy, Ramón Esteban c. AFIP S/ Acción meramente declarativa de inconstitucionalidad).

A Corte Argentina entendeu que os aposentados devem ser considerados como “vulneráveis”, diante das necessidades reais decorrentes do envelhecimento. Sem dúvida, a maioria das pessoas aposentadas são acometidas por doenças que as levam a ter gastos elevados com medicamentos. Tais circunstâncias, associadas à não recomposição das aposentadorias diante da escalada inflacionária, comprometem a existência e qualidade de vida dos aposentados e pensionistas, no momento em que deveriam estar desfrutando dos anos de trabalho e contribuição para o desenvolvimento da sociedade.

O Centro de Informação Judicial da referida Corte Constitucional anunciou o seguinte:

La Corte Suprema, tras recordar el alcance de los principios de igualdad y de razonabilidad en materia tributaria, destacó que el caso debía resolverse sobre la base de la naturaleza eminentemente social del reclamo efectuado por la actora, y teniendo en cuenta que la reforma constitucional de 1994 había garantizado “la igualdad real de oportunidades y de trato” a favor de los jubilados, como grupo vulnerable (artículo 75 inciso 23). El envejecimiento y la enfermedad son causas determinantes de vulnerabilidad que obligan a los jubilados a contar con mayores recursos para no ver comprometida su existencia y calidad de vida. Por ende, el legislador debe dar respuestas especiales y diferenciadas para los sectores vulnerables – entre ellos los jubilados-, con el objeto de asegurarles el goce pleno y efectivo de todos sus derechos sin que el sistema tributario pueda quedar apartado del resto del ordenamiento jurídico. 

 Consideró que la mera utilización de la capacidad contributiva como parámetro para establecer impuestos a los jubilados y pensionados no era suficiente al no tener en cuenta la vulnerabilidad de los jubilados que ampara la Constitución Nacional, quienes ante esa omisión quedan en una situación de notoria e injusta desventaja.

 Concluyó en que el texto actual de la ley es insuficiente y contrario al nuevo mandato constitucional, motivo por el cual no puede retenerse ninguna suma por Impuesto a las Ganancias de los haberes jubilatorios de los demandantes hasta tanto el Congreso Nacional dicte una ley que revea la situación de las jubilaciones ante este impuesto, debiendo reintegrarse a los actores los montos retenidos desde la interposición del reclamo.[1]

A cobrança de imposto de renda sobre proventos de aposentados e pensionistas (e também a de contribuições previdenciárias, com base no princípio da solidariedade, como considerou o STF brasileiro no julgamento das contribuições previdenciárias dos servidores públicos inativos[2]) traz ao debate o princípio da capacidade contributiva (econômica), uma vez  que os aposentados e pensionistas, na sua grande maioria, têm os proventos comprometidos de tal forma com a simples manutenção de suas vidas, os gastos com medicamentos e tratamentos médicos, que têm prejudicada a qualidade de vida e até mesmo a sua sobrevivência; não devendo ficar reduzida a isenção de imposto de renda apenas, para os aposentados com mais de 65 anos de idade, até o limite de R$ 1.903,86 (como definido no artigo 6o, XV, alínea “i”, da Lei 7.713/88, com alteração dada pela Lei 13.149/2015) e para os aposentados portadores de doenças graves (artigo 6o, XIV, da Lei 7.713/88). 

Por tal razão, a Corte Constitucional da Nação Argentina deu uma excepcional demonstração de respeito à dignidade da pessoa humana, ao excluir da tributação do imposto de renda os  trabalhadores que, no passado, contribuíram para o desenvolvimento do país; devendo ser reacendido este questionamento na reforma tributária em curso na nossa Câmara dos Deputados, que deve indagar por que trabalhadores na terceira idade são obrigados a pagar imposto de renda, enquanto banqueiros (cada vez mais ricos) estão isentos da tributação na distribuição de lucro que recebem de suas empresas.


[1] https://www.cij.gov.ar/nota-34372-La-Corte-Suprema-declar–en-otros-once-casos-la-inconstitucionalidad-del-cobro-a-los-jubilados-del-Impuesto-a-las-Ganancias.html

[2] Plenário do STF. Julgamento das Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADI) n. 3.105 e 3.128, ocorrido em 18/08/2004. http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=63276

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